sábado, 18 de junho de 2011
Ceará.
O Ceará é uma das 27 unidades federativas do Brasil. É o décimo segundo estado mais rico do país. Está situado na Região Nordeste e tem por limites o Oceano Atlântico a norte e nordeste, Rio Grande do Norte e Paraíba a leste, Pernambuco a sul e Piauí a oeste. Sua área total é de 146.348,30 km²,[6] ou 9,37% da área do Nordeste e 1,7% da superfície do Brasil. A população do estado estimada para o ano de 2008 foi de 8.450.527 habitantes, conferindo ao território a oitava colocação entre as unidades federativas mais populosas.
A capital e maior cidade é Fortaleza, sede da Região Metropolitana de Fortaleza (RMF). Outras cidades importantes fora da RMF são: Juazeiro do Norte e Crato na Região Metropolitana do Cariri, Sobral na região noroeste, Itapipoca na região norte, Iguatu na região centro-sul e Quixadá no sertão.[7] Ao todo são 184 municípios.
O estado é conhecido nacionalmente pela beleza de seu litoral, pela religiosidade popular e pela imagem de berço de talentos humorísticos. A jangada, ainda comum ao longo da costa, é considerada um dos maiores símbolos do povo e da cultura cearenses. O Ceará concentra 85% de toda caatinga do Brasil, e é o segundo estado com melhor qualidade de vida do Norte-Nordeste segundo a FIRJAN.[8]
Em 2010, bateu recorde em investimentos, foi o quarto estado que mais investiu em infraestrutura, foram mais de R$ 3 bilhões, ficando a frente de estados importantes como Rio Grande do Sul, Paraná, Bahia e Pernambuco.[9]
O Ceará é conhecido como "Terra da Luz", numa referência à grande quantidade de dias ensolarados, mas que também remonta ao fato de o estado ter sido o primeiro da federação a abolir a escravidão, em 1884, quatro anos antes da Lei Áurea. Por esse fato, o jornalista José do Patrocínio considerou o estado como "a terra da luz".
O nome Ceará significa, literalmente, canto da jandaia.[11] Segundo o escritor José de Alencar, Ceará é nome composto de cemo - cantar forte, clamar, e ara - pequena arara ou periquito (em língua indígena). Há também teorias de que o nome do estado derivaria de Siriará, referência aos caranguejos do litoral.
O povo cearense foi formado pela miscigenação de indígenas catequizados e aculturados após longa resistência, colonizadores europeus e negros que viviam como trabalhadores livres ou escravos.[12] O povoamento do território foi bastante influenciado pelo fenômeno natural da seca.
Era uma sociedade rural baseada sobretudo na pecuária, principalmente no sertão, e na agricultura, em especial nas serras e vales. A elite latifundiária, mediante o poder econômico e complexas relações de parentesco e afilhadagem, possuía controle de quase todos os aspectos da vida social. Os "coronéis" mantinham em suas propriedades muitos dependentes que lhes prestavam serviços ou entregavam parte de sua produção em troca da posse de um lote de terra, além de trabalhadores assalariados.[13]
O desenvolvimento independente do Ceará aconteceu apenas depois de sua desagregação de Pernambuco em 1799,[14] e sua história foi marcada por lutas políticas e movimentos armados. Essa instabilidade se prolongou durante o Império e a Primeira República, normalizando-se depois da reconstitucionalização do País em 1945.
O Ceará era habitado ancestralmente por indígenas dos troncos Tupi (Tabajara, Potiguara, Tapeba, entre outros) e Jê (Kariri, Inhamum, Jucá, Kanindé, Tremembé, entre outros), cujas tribos ainda hoje denominam vários topônimos no Ceará.[15] Estes povos já negociavam Tatajuba, ambar, algodão bravo e outros produtos com os estrangeiros que aportavam nas costas cearenses, antes que os colonizadores portugueses chegaram em 1603 através do litoral. O povoamento pelos protugueses foi bastante dificultado nas primeiras décadas de colonização, devido à intensa resistência dos nativos e à interveniência de secas.
Os navegadores espanhóis Vicente Yáñez Pinzón e Diego de Lepe desembarcaram na costa cearense antes da viagem de Pedro Álvares Cabral ao Brasil.[16] Pinzón chegou a um cabo identificado como "Porto Formoso", que se acredita ser o Mucuripe, e Lepe, à barra do rio Ceará, em Fortaleza. Essas descobertas não puderam ser oficializadas devido ao Tratado de Tordesilhas (1494).
As terras equivalentes à Capitania do Ceará foram doadas a Antônio Cardoso de Barros, que, porém, não se interessou em colonizá-las.[17] Ficaram assim entregues à ação de corsários, notadamente franceses, que em 1590 estabeleceram a Feitoria da Ibiapaba, para explorar o âmbar-gris, as madeiras de lei, a pimenta e o algodão nativo. Os holandeses também já negociavam com os nativos cerearense, um bom exemplo disso e capitão Jean Baptista Sijens, que esteve no Mucuripe em 1600.[18] Os esforços de povoamento pelos portugueses visavam principalmente a vencer a resistência indígena e garantir o domínio luso contra estrangeiros.
Em 1597/98 um ramo da etnia Potyguara que habiatava a região ao redor do Forte dos Reis Magos, migrou e estabeleceu-se na região entre as margens dp rio Cocó, rio Ceará e ao fundo as serras de Pacatuba e Maranguape[19].
Graças ao contatos mantidos entre os índios Potyguara e portugueses, estes últimos planejaram chegar ao Ceará e estabelecer um ponto de apoio na jornada para os Maranhão. Desta forma a primeira tentativa efetiva de colonização portuguesa ocorreu com Pero Coelho de Sousa em 1603, que na sua fundou o Forte de São Tiago na Barra do Ceará. Em 1605, porém, sobreveio a primeira seca registrada na história cearense, fazendo que Pero Coelho e sua família abandona-se o Ceará.
Depois do fracasso de Pero Coelho, os padres jesuítas Francisco Pinto e Pereira Figueira chegaram ao Ceará com o intuito de evangelizar os silvícolas. Avançaram até a Chapada da Ibiapaba, onde ficaram até a morte do padre Francisco Pinto em outubro do mesmo ano. O padre Pereira Figueira retornou a Pernambuco em 1608, sem grandes sucessos.[20]
Em 1612, nova expedição foi enviada como parte dos esforços de conquista do Maranhão, então dominado pelos franceses. Fazia parte desta jornada Martim Soares Moreno, que funda o Fortim de São Sebastião, também na Barra do Ceará. Ao retornar, em 1621, encontrou o forte destruído, mas lançou as bases para o início da exploração econômica pelos portugueses e o apaziguamento dos nativos.[21][22]
Os holandeses, já estabelecidos em Pernambuco desde 1630, tentaram invadir o Ceará já em 1631, atendendo ao pedido das nações índigenas cearenses. Sendo que a primeira tentativa de conquista holandesa fracassou.
Em 1637, o território foi tomado pelos holandeses, graças um trabalho conjunto com os índios nativos, no qual os portugueses foram feitos prisioneiros e levados para Recife. Os holandeses estabelceram-se e também chegaram usar o Ceará com ponto de apoio a conquista holandesa do Maranhão, em 1641.
Nesta época de ocupação holandesa (1637-1644), o forte da Barra do Ceará foi reformado, foi construído um forte em Camocim, as pesquisas para a exploração das salinas foram feitas e em 1639, George Marcgraf vem ao Ceará numa expedição. Uma expedição que se deu partindo do Fortim de São Sebastião percorreu o oeste cearense até a região dos Imhamuns.[23]
Os holandeses ficaram no Ceará até 1644, quando Gideon Morris e sua tropa, que retornavam das batalhas no Maranhão, foram mortos numa emboscada organizada pelos próprios índios. Com a emboscada de 1644, o Fortim de São Sebastião também foi destruído.
Entre 1644 até 1649, o Ceará ficou sendo administrado pelas etnias existentes. A presença européia só retorna em 1649, depois de contatos e negociações feitas entres os nativos e Antônio Paraupaba em 1648.[24]
Com a chegada de Matias Beck, em 1649, o Siará Grande entrou num novo período histórico: na embocadura do riacho Pajeú, o Forte Schoonenborch foi construído, os trabalhos de busca das supostas minas de prata foram iniciadas e os holandeses procuraram mais uma vez se estabelecer na região, sob forte hostilidade dos indígenas.[25]
Após a capitulação holandesa em Pernambuco, o forte foi entregue aos portugueses, restabelecendo-se assim o poderio português, rebatizando-o de Fortaleza de Nossa Senhora da Assunção.[26] Neste período muitas das nações índigenas que apoiaram os holandeses, que não estavam protegidas pelo Tratado de Taborda, fugiram para o Ceará, procurando refúgio das retaliações lusas.[27] Desta forma, o Ceará acabou sendo o centro de batalhas na Guerra dos Bárbaros.
Na continuação da colonização pelos portugueses[21] a influência dos jesuítas foi determinante, resultando na criação de aldeamentos (Porangaba, Paupina, Viçosa e outros), muitos deles fortemente militarizados, onde os indígenas eram concentrados para serem catequizados e assimilados à cultura lusitana. Tribos tupis aliadas dos portugueses também vieram se instalar em vilas militarizadas na capitania. Dessas reduções surgiram às primeiras cidades da capitania, como Aquiraz e Crato. O processo de aculturação, no entanto, não se deu sem grandes influências de crenças e produtos nativos. A intensa resistência levou a episódios sangrentos, destacando-se a Guerra dos Bárbaros, ao longo de várias décadas do século XVIII, que resultou na fuga dos habitantes da capital Aquiraz, em 1726, para Fortaleza, que passou a ser a capital.
Outras frentes colonizadoras surgiram com a instalação da pecuária na capitania através dos "sertões de dentro" e "sertões de fora", com levas oriundas respectivamente da Bahia e de Pernambuco.[29] Vilas como Icó, Aracati, Sobral e outras surgiram do encontro de rotas do gado tangerino, que era levado até as feiras ou fregueses. Mais tarde, o custoso transporte do gado perdeu importância para a produção da carne de charque que, no final do século XVIII, se disseminou também para a Região Sul do Brasil. Nas regiões serranas, houve grande afluxo de pessoas que se dedicaram à agricultura policultora, o que veio a caracterizá-las pela maior diversificação da produção e pela estrutura menos latifundiária que a do sertão. O vale do Cariri assentou-se menos na pecuária e mais na cultura da cana-de-açúcar, propiciando a entrada de maiores levas de escravos africanos. O litoral, refúgio de muitos indígenas e negros livres ou fugitivos, povoou-se de vários vilarejos de pescadores.
As principais vilas da capitania da época charqueana eram Aracati, Crato, Icó, e Sobral. A que mais ganhou destaque foi Aracati, devido ao comércio de couro e carne de charque. Entre os anos de 1750 a 1800, Aracati viveu seu apogeu,[30] mas com uma grande seca na região entre os anos de 1790 até 1793, os rebanhos bovinos morreram e a produção de charque transferiu-se para o Rio Grande do Sul, que assumiu a posição de abastecedor principal das outras regiões.
Em 1799 o Ceará adquiriu independência em relação à Pernambuco, e Bernardo Manuel de Vasconcelos foi nomeado seu primeiro governador, sendo o responsável pelo início da urbanização de Fortaleza.[14] No final do século XVIII, especialmente com a Guerra de Independência norte-americana, o algodão foi tomando relevante papel na pauta de exportações do Ceará. Com o declínio do charque, cuja distribuição era centrada em Aracati, Fortaleza se tornou a principal cidade cearense devido à sua condição de destino dos produtos agrícolas cultivados nas diversas serras que se elevam nas vizinhanças do município.
Em 1812 foi nomeado governador do Ceará o português Manuel Inácio de Sampaio e Pina Freire, o qual reuniu os literatos no palácio do governo e deu incentivo às artes e à urbanização da capital por meio dos projetos de Silva Paulet. No começo do século XIX o Ceará passou por movimentos rebeldes, como a República do Crato, em 1813, e também influências da Revolução Pernambucana de 1817, movimentos de cunho republicano-liberal liderados pela família cratense dos Alencar. Tais movimentos foram reprimidos com dureza pelo governador provincial do Ceará, Inácio de Sampaio.
Em 1825 o Ceará tomou parte na Confederação do Equador, com o liberal Tristão Gonçalves aplicando um golpe e tornando-se chefe do governo.[32] A Confederação foi frustrada pela forças imperiais, e Tristão morreu durante os combates contra as forças legalistas do Império. O ciclo de conflitos terminou com a Insurreição de Pinto Madeira, "coronel" de Jardim, que visava ao retorno da monarquia absolutista e representava interesses regionais opostos aos da cidade do Crato, de inspiração marcantemente liberal.
Em meados de 1860, devido à Guerra de Secessão norte-americana, houve um surto de crescimento da produção do algodão. Tal florescimento não durou muito tempo, mas deu grande impulso à modernização da infra-estrutura da Província como exemplo a Estrada de Ferro de Baturité, inaugurada em 1873. Em 1877, tem início a chamada Grande Seca de 1877-1879, um dos mais severos períodos de seca prolongada da história cearense, levando à morte milhares de pessoas e acarretando emigração maciça de retirantes. Fortaleza recebeu uma população de fugitivos da seca quatro vezes maior que a sua própria
Logo após, a produção da borracha explode na Amazônia, e muitos cearenses vítimas da seca migram para esta região.[35]
A gravidade dessa estiagem chamou a atenção do governo central e mesmo de cientistas, havendo então a produção de textos científicos e propostas de melhoramento da situação da população cearense,[36] cuja maior parte não foi posta em prática ou se relevou ineficaz. Por outro lado, houve um aceleramento nas obras do Açude do Cedro, em Quixadá, o primeiro do Nordeste, que só ficou pronto em 1906.[37] A Grande Seca e as estiagens seguintes impulsionaram o surgimento da indústria da seca e geraram uma tradição migratória no estado.[38] Entre 1869 e 1900, 300 mil cearenses abandonaram sua terra, 85% deles indo para a Amazônia.[39]
Anos antes da proclamação da República notabilizou-se a campanha abolicionista no Ceará, que logrou abolir a escravidão no estado em 25 de março de 1884, quatro anos antes da Lei Áurea. O movimento contou com a participação de várias sociedades libertárias, inclusive a maçonaria, mas o maior destaque ficou com Francisco José do Nascimento, o Dragão do Mar, jangadeiro que impulsionou o abolicionismo ao comandar seus companheiros, em 1881, numa total recusa a transportar escravos para dentro ou fora da província.[10] A primeira cidade brasileira a abolir a escravatura foi Acarape, atual Redenção, em 1º de janeiro de 1883. Devido a isso, o Ceará recebeu a alcunha de Terra da Luz, de início por José do Patrocínio. A escravidão, que jamais fora dominante no estado, estava praticamente extinta nos anos de 1880, de forma que não houve resistência à abolição mesmo por parte da elite agrícola.
No início da Primeira República, apesar das estiagens que assolaram o Ceará, Fortaleza continuou a desenvolver-se econômica e politicamente, ao contrário do resto do estado. Ocorre nas primeiras décadas do século XX um afluxo de imigrantes, embora pequeno em relação ao de outras regiões, consistindo principalmente de portugueses e sírio-libaneses.[40] Os descendentes destes, em particular, ganharam grande destaque no comércio, como mascates, e, futuramente, na política cearenses.[41]
Começou a ganhar destaque a atividade dos cangaceiros, que, agindo em grupos organizados e promovendo saques em cidades e propriedades rurais, desestabilizaram o interior do Nordeste por décadas. A forte religiosidade popular e a grande miséria estimulavam uma profusão de líderes messiânicos e formas de fanatismo religioso. O cearense Antônio Conselheiro, de Quixeramobim, chegou a formar, na Bahia, o arraial de Canudos, cuja forte atração populacional e ideológica, contrária aos interesses da elite fundiária, deflagrou a Guerra de Canudos.[42] Isso, porém, não extinguiu a influência dos líderes religiosos.
Entre 1896 e 1912, a hegemonia política foi monoliticamente concentrada nas mãos do comendador Nogueira Accioly e de sua família, que estabeleceram uma poderosa oligarquia que comandava a maior parte dos escalões do poder estadual. Em 1912, Accioly apontara como seu candidato Domingos Carneiro, contra Franco Rabelo, representante da política do salvacionismo do presidente Hermes da Fonseca, gerando uma conturbada campanha eleitoral. A dura repressão policial a uma passeata de crianças em favor de Rabelo, que causou a morte de algumas delas e feriram outras, desencadeou uma revolta de três dias da população fortalezense, forçando o governador Accioly a renunciar, evento conhecido como Sedição de Fortaleza. Franco Rabelo passou a governar o Ceará.
No fim do século XIX o carismático Padre Cícero passou a atrair milhares de sertanejos para um pequeno distrito do Crato, que se tornaria Juazeiro do Norte em 1911, persuadidos pela sua fama de milagreiro, atribuída à suposta transformação em sangue da hóstia recebida do padre pela beata Maria de Araújo. Mesmo após a perda de sua ordenação, em virtude de controvérsias sobre o milagre, o Padre Cícero tornou-se cada vez mais conhecido e, apesar de seu caráter messiânico, foi hábil em evitar grandes conflitos com a elite local, tornando-se ele próprio um poderoso chefe político. Em 1914 irrompeu a Sedição de Juazeiro, opondo o governador interventor Franco Rabelo e o Padre Cícero, que havia conquistado os postos de prefeito de Juazeiro do Norte e vice-governador.[44] Rabelo iniciou uma perseguição ao líder religioso. Com isso, liderados por Floro Bartolomeu, os sertanejos fiéis ao Padim Ciço reuniram-se para lutar contra as tropas estaduais, conseguindo derrotá-las em sua cidade e fazê-las recuar até Fortaleza, onde, vencendo, destituíram o governador. Estabeleceu-se um relativo equilíbrio entre as oligarquias cearenses, que durou até a Revolução de 30.
Em 1915 o Ceará sofreu com uma gravíssima seca levando a novo êxodo da população cearense para a Amazônia, região que, devido às intermitentes, mas significativa emigração recebeu grande afluxo e influência de cearenses. A gravidade da seca inspirou a escritora Rachel de Queiroz em sua famosa obra O Quinze. O sertão sofreu mais uma estiagem em 1932, e o governo estadual não pôde dispor mais da Amazônia como refúgio para os flagelados.
Diante disso, os campos de Concentração no Ceará que já foram usados na estiagem de 1915, foram recriados.[45] [46] Conhecidos como Currais do Governo, [47] tinham como objetivo, impedir que os retirantes que fugiam da seca e da fome, chegassem às grandes cidades. A instabilidade política e social foi crescendo no Estado. Nos anos 1930, surgiu no Crato o movimento messiânico do Caldeirão de Santa Cruz do Deserto, liderado pelo beato José Lourenço.[48] Igualitária e agrária, a comunidade do Caldeirão perseguia a auto-suficiência, passando a ser vista pelo governo e pelos fazendeiros poderosos da região como uma má influência. Em 1937 o Caldeirão foi invadido e alvo de bombardeio aéreo, resultando no massacre de aproximadamente 400 indivíduos.
Após a Revolução de 1930, o Ceará passou a ser governado por interventores do Governo Federal.[49] Ascenderam duas organizações políticas que dominaram o cenário estadual: a Legião Cearense do Trabalho, com nítida influência fascista, e a Liga Eleitoral Católica, fortemente religiosa, representante da elite tradicional e de grande apelo popular. Nos anos 1940 mais uma seca (1943) assolou o Ceará, e, com a Segunda Guerra Mundial e os Acordos de Washington, o governo de Getúlio Vargas incluiu o Ceará no seu projeto político. A instalação de uma base norte-americana em Fortaleza trouxe ideais democráticos e antifascistas que passaram a ser defendidos em várias manifestações. Sob uma forte propaganda governamental de migração (SEMTA), cerca de 30 mil cearenses tornaram-se Soldados da Borracha, produzindo esse produto na Amazônia para abastecer os exércitos aliados.
A República Nova no Ceará tem início com a nomeação sucessiva de seis interventores até as eleições de 1947, seguindo-se a eleição de Faustino de Albuquerque pela UDN. Durante seu governo, nas eleições presidenciais de 1950, o candidato udenista Eduardo Gomes obteve a maior votação, e Getúlio Vargas ficou na 3ª colocação no estado.[51] Para a direção do governo estadual é eleito Raul Barbosa. Durante seu governo houve a instalação do Banco do Nordeste do Brasil (1952) em Fortaleza. No mesmo ano o governo federal inaugurou oficialmente o Porto do Mucuripe, em cujo entorno foram instaladas várias usinas termoelétricas.
Durante a década de 1950 surgiram ou se consolidaram vários dos maiores grupos econômicos do Ceará, como Deib Otoch, J. Macêdo, M. Dias Branco, Edson Queiroz e Jereissati. Paulo Sarasate foi o terceiro governador eleito no período. Ainda nessa década tem início uma nova onda migratória para vários estados e regiões. Entre as décadas de 1950 e 1960, a população cearense passou de 5,1% para 4,5% do total da população brasileira.[52] Em 1958 foi eleito Parsifal Barroso que teve a ajuda do governo federal para combater as mazelas decorrentes da seca daquele ano, sendo a principal obra o Açude Orós, inaugurado em 1961. Em Fortaleza o Grupo Severiano Ribeiro inaugurou o Cine São Luis. Em 1962, foi criado o Banco do Estado do Ceará (BEC).[53]
Em 1963 Virgílio Távora foi eleito governador do Ceará, exercendo o mandato até 1966, mesmo com o surgimento da ditadura militar em 1964. Seu governo foi marcado pela criação do "PLAMEG I" - Plano de Metas do Governo - que visou à modernização da estrutura do estado com a ampliação do porto do Mucuripe e a transmissão da energia de Paulo Afonso para a capital.[54] Foram criados ou instalados, também, o Distrito Industrial de Maracanaú, a CODEC e a Companhia DOCAS do Ceará. Com o AI-2, Virgílio aderiu à ARENA, e seu vice Figueiredo Correia ao MDB.
Plácido Castelo foi eleito pela Assembleia Legislativa em 1966. Durante seu governo houve perseguição política a deputados e várias manifestações, acarretando a prisão e tortura de estudantes e trabalhadores, assim como atentados a bomba em Fortaleza.[55] Foi criado o Banco de Desenvolvimento do Ceará (BANDECE) e pavimentada a rodovia CE-060, a "estrada do algodão". Também tiveram início as obras do estádio Castelão.
Durante o governo de César Cals (1971-1975) se sucedeu o auge da repressão militar. Vários cearenses de esquerda estiveram envolvidos na Guerrilha do Araguaia.[56] Cals procurou governar tecnocraticamente, formando sua própria facção política e rompendo com Virgílio Távora. Seu sucessor, Adauto Bezerra (mandato de 1975 a 1978) não acontecem grandes mudanças. Adauto volta-se politicamente para o interior com a criação de uma secretaria de assuntos municipais. Renuncia seu mandato para se eleger deputado federal. O vice-governador Waldemar Alcântara toma posse e termina o mandato.
Virgilio Távora retorna ao governo em 1979, sendo o último eleito indiretamente, e resgata seu primeiro governo com a criação do PLAMEG II. Estabelece o Fundo de Desenvolvimento Industrial para complementar o sistema de incentivos regionais à indústria, impulsionando uma industrialização muito concentrada na Região Metropolitana de Fortaleza.[57] Criou-se o PROMOVALE (projetos de irrigação), e sua esposa, Luiza Távora, programou projetos sociais como a Central de Artesanato do Ceará. Seu governo foi marcado pela ausência, quase que total, de oposição na Assembleia, nomeações aproximadas de 16.000 pessoas para cargos públicos e várias greves. Em 1983, Gonzaga Mota foi eleito pelo voto popular, rompendo com os coronéis anteriores para criar seu próprio grupo político. Seu rompimento rendeu-lhe ataques do regime militar com a suspensão de verbas federais.
A Nova República coincide no Ceará com a eleição de Maria Luiza para o cargo de prefeita de Fortaleza em 1985. Foi a primeira prefeita de capital estadual eleita pelo Partido dos Trabalhadores e a primeira mulher a ser eleita para esse cargo após o regime militar. A insatisfação com a política praticada durante a ditadura militar e o movimento de redemocratização impulsionaram as transformações no poder político, com a decadência da hegemonia tradicional do coronelismo.[58]
Gonzaga Mota deixou o governo com pagamentos atrasados ao funcionalismo e descontrole nas contas públicas.[59] Rompido com os antigos aliados, Mota, junto com partidos de esquerda e o PMDB, apóia a candidatura oposicionista liderada pelo jovem empresário Tasso Jereissati, que conseguiu se eleger com a promessa de modernizar a administração pública e as finanças, combater o clientelismo dos governos anteriores, moralizar a administração pública e desenvolver a economia estadual. A nova gestão se autodenominou como "Governo das Mudanças".[60] Nas duas décadas seguintes, o projeto avançou com a eleição de Ciro Gomes, seguida de um segundo mandato de Tasso Jereissati. Com a instituição da reeleição no país, Tasso ainda governou o Estado pela terceira vez, tornando-se o primeiro político a conseguir tal fato em mais de 100 anos de história republicana.[58] Nas duas décadas seguintes, Jereissati e seus aliados passaram a deter a hegemonia política no Estado, e rapidamente perdem a aliança com partidos mais à esquerda.[58] Ciro Gomes, então prefeito de Fortaleza, se candidatou e foi eleito em 1990 para o cargo de governador, apoiado por Tasso.
Os "Governos das Mudanças" priorizaram o aumento das receitas, visando a investimentos públicos e privados em infra-estrutura e nos setores industrial e de serviços, enquanto o agropecuário permanece à margem. Politicamente, há uma relativa diminuição de poder dos "coronéis", com ampliação do poder do grande empresariado. O saneamento das contas estaduais - atingido, em parte, pelo propósito de diminuir as despesas através de reformas administrativa e financeira, bem como de demissões e achatamento salarial no funcionalismo público - garantiu superávits entre 1988 e 1994, mas com a consolidação do Plano Real volta-se a uma predominância de déficits.[59]
Tasso foi eleito novamente em 1994 e reeleito em 1998, concentrando os esforços governamentais em grandes obras, como o Porto do Pecem, o novo Aeroporto Internacional de Fortaleza, o Açude Castanhão, o Centro Cultural Dragão do Mar e o Canal da Integração. O terceiro "Governo das Mudanças" (1994-1997) se caracterizou pela privatização de empresas algumas estatais e extinção de órgãos, enxugando a máquina, reformando a Previdência estadual e dando maior racionalidade aos gastos públicos.[59] Lúcio Alcântara, eleito com o apoio de Tasso, continuou, em linhas gerais, o modelo político anterior, mas não conseguiu se reeleger em 2006, quando rompeu com o PSDB, posteriormente mudando para o Partido da República. Cid Gomes, do PSB, ex-prefeito de Sobral e aliado histórico de Tasso, venceu a disputa, com o apoio do PT, que em Fortaleza, já havia vencido com Luizianne Lins, eleita em 2004 mesmo sem apoio real do partido, o qual, devido às alianças partidárias nacionais, apoiou o candidato Inácio Arruda, do PC do B.[61] Em 2008, Luizianne Lins foi reeleita.
O Estado se beneficiou também da guerra fiscal, que então se iniciava, o que, somada à mão-de-obra barata, atraiu várias indústrias, as quais se concentraram em algumas poucas cidades. O crescimento médio do PIB, de 4,6%, foi superior à média nacional e nordestina nos anos 1990, continuando a tendência iniciada na década de 1970.[62] As ações do governo, aliado aos esforços do empresariado local, e os incentivos de instituições de grande importância na história econômica recente do Ceará, como o BNB e a Sudene, foram determinantes para tal desempenho.
O forró eletrônico se popularizou na década de 1990, e o Ceará começou a despontar, seguindo a tendência do litoral nordestino, como grande polo de turismo. Ao longo dessa década, com ações como o Programa de Saúde da Família (PSF), o Estado também realizou grandes avanços na redução da mortalidade infantil. A migração em direção a Fortaleza segue forte.[63] A segurança pública tornou-se muito mais problemática entre 1990 e 2003, com a taxa de homicídios subindo de 8,86 para 20,15 por 100 mil habitantes.[64]
Apesar de vários avanços na saúde e educação básicas e do crescimento econômico estável, a chamada Era Tasso não alterou a estrutura socioeconômica problemática do Ceará, em especial a concentração de renda,[58] que piorou entre 1991 e 2000,[65] a má distribuição fundiária e a enorme disparidade regional (sobretudo entre a capital e o interior). Em 1999, segundo o Banco Mundial, metade dos cearenses viviam abaixo da linha de pobreza.[59] No início do século XXI, consolidou-se a tendência de queda na tradicional emigração de cearenses, que, no período 2001-2006, reverte-se para um saldo positivo de 38,3 mil pessoas, o que se atribui à melhoria das condições de vida e à maior estabilidade proporcionada por programas sociais, que permitiram a fixação do pobre em sua terra e o retorno de parte dos emigrantes.
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